quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Gente do Bem. by Dilson Cunha


GENTE DO BEM

"Eu não sou uma pessoa má", disse um dos cruéis assassinos que espancaram até a morte um vendedor ambulante na estação do metrô em São Paulo.

Inauguramos há algum tempo a estúpida era da "gente do bem". Gente do bem é aquele tipo de gente que não foi predestinado à maldade. Maldade, no caso deles, é um caso de acidente de percurso, não de índole. Índole é um caso de outro tipo de gente, independentemente se esse "outro tipo de gente" tenha cometido um crime ou não. É aquela gente presumidamente má.

Com o desaparecido e assassinado pela PM do Rio, o Amarildo, foi assim. Li de um monte de "gente do bem" aqui no Fb desconfianças sobre quem era mesmo aquele aquele ajudante de pedreiro, porque não era possível que um grupo de pessoas do bem o tivesse matado à toa, afinal, com aquele perfil, negro, pobre, favelado e morto pela polícia, dificilmente ele se encaixaria no perfil de "gente do bem". Dele se diz que estava no local errado na hora errada com as pessoas erradas. "Paciência". Amarildo não deveria mesmo ser "gente do bem".

Portanto, é isso que faz um perverso dizer que, apesar de sua perversidade, não é uma pessoa má. Não se admire, ele não está sozinho. Essa é uma marca desses nossos últimos anos. Ficamos assim, essa dissonum personalitatem. Erroneamente, cremos ser maus não pela maldade que fazemos, mas por uma questão de natureza. Não sei se "bons antecedentes" é uma invenção brasileira, mas fomos nós quem a levamos às últimas consequências.

No convívio social, tem-se apenas uma maneira de avaliarmos o mal: pela maldade praticada. Não se está em questão, como no ideiário de consciência da cultura da judaico-cristã, a subjetividade do bem. É-se ou não mal pelo mal que se pratica. Ora, quando falou do bem que um "repugnante" samaritano fizera, Jesus foi simples e conclusivo para com os do seu "grupo": "façam como ele". Nós, "gente do bem", é que cuidamos de apelidar àquele pertencente à gente do mal de "bom samaritano", ou seja, uma exceção.

Estamos numa sociedade onde gente do mal, que defende a tortura como expediente moral, a ditadura como regime político, o fuzilamento como expediente assepsia ideológica, é tratada como "gente do bem". Onde prender alguém em um poste e fazer justiçamento com as próprias mãos linchando-o, é justiça. Onde perseguir, execrar e surrar moral e civilmente os homossexuais é ser um cristão piedoso.

"Eu não sou uma pessoa má." Eichmann, tocando quartetos de Brahms para os amigos, provavelmente diria a mesma coisa de si mesmo.

Nunca fomos tão maus quando quanto nos tornamos tão "gente do bem".

Dilson Cunha
29.12.16

domingo, 7 de agosto de 2016

Ataques no RN põem em alerta planos de bloqueio de celular nos Estados

O que a matéria abaixo não diz, é que cerca de 200 servidores da segurança pública do Estado do RN se desligaram de suas atividades, no início de julho, para disputar uma cadeira nas eleições municipais.

Com um contingente insuficiente, e ainda mais reduzido significativamente, fica fácil para o aumento da criminalidade.

O pior é que vai pagar essa conta é a população.
Primeiro paga pelos afastados, mas afinal a Lei lhes garante esse direito - do qual discordo, pois grande parte desses candidatos não têm sequer seus votos quando os sufrágios são contados;
Segundo, paga pelo estrondoso aparato necessário para retornar o status quo de uma condição mínima de tráfego (ou alguém acha que a movimentação de tropas das forças armadas é a fundo perdido?).

Os candidatos já começam mal: contribuem para ampliar a insegurança, certamente o contrário do que defendem em seus discursos.

Joserrí de Oliveira Lucena
Dinheiro público é da minha e da sua conta



Folha, 07/08/2016  02h00

DE SÃO PAULO

Ataques no RN põem em alerta planos de bloqueio de celular nos Estados

A onda de ataques de criminosos que atinge o Rio Grande do Norte desde o fim do mês passado, em reação ao uso de bloqueadores de celular num presídio, tem deixado em alerta Estados que planejam usar os aparelhos.

No Ceará, explosivos já foram deixados em abril deste ano perto do prédio da Assembleia Legislativa como forma de ameaça, devido à votação da lei que obrigava as operadoras de telefonia a instalar os bloqueadores.

"Uma coisa é certa: que pode haver [ataque], pode, mas o Estado não vai se intimar", afirma o secretário de Justiça e Cidadania do Ceará, Hélio Leitão. "Nossas forças de segurança estão preparadas e não deixaremos de fazer nada por receio de reação da criminalidade. Faremos um enfrentamento do crime", diz.

Para Leitão, o bloqueio influi diretamente na "criminalidade extramuros". "Sabe-se que muitos crimes são coordenados dentro de prisões."

O Ceará conseguiu aprovar a lei em março, mas as operadoras recorreram à Justiça.

Na semana passada, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que os Estados não podem legislar sobre o tema.

Além do Ceará, Mato Grosso do Sul, Paraná, Bahia, Santa Catarina e Piauí já tinham criado suas leis e planejavam instalar os bloqueadores.

Os governadores agora devem apoiar no Congresso a criação de uma legislação nacional sobre o tema. Os casos do Ceará e do Piauí ainda não foram julgados no Supremo.

"Não é uma questão local do Estado, precisa ser uma ação do país, do Brasil. O Congresso precisa aprovar essa lei", disse, nesta sexta-feira (5), o governador do Ceará, Camilo Santana (PT).

No Piauí, que pretendia instalar os aparelhos em seus 15 presídios até o final do ano, com base na lei, o governo tem realizado monitoramentos dentro e fora dos presídios desde o início da onda de violência no Rio Grande do Norte, segundo o secretário de Justiça, Daniel Oliveira.

"Nós temos uma rede de inteligência entre as polícias e a Secretaria de Justiça. Independentemente de ter [uma ameaça contra o uso dos bloqueadores nas prisões], nosso objetivo é implantar essa tecnologia", diz.
Com a decisão do STF, o Estado já pensa em abrir uma licitação para contratar um empresa que bloqueie o contato de presos com o mundo exterior pelos celulares.

Para o advogado Rodrigo Mudrovitsch, da Acel (Associação Nacional das Operadoras de Celulares), entidade que contesta as leis estaduais, a responsabilidade pela segurança dos presídios é atribuição do Estado, e não das empresas de telefonia.

"A gente entende que é uma transferência de responsabilidades que não se justifica", afirma o advogado.

Para ele, a decisão do STF foi uma mensagem que deve ser respeitada pelos outros Estados. "Não há motivo para se imaginar que novos casos que chegarem sejam julgados de outro jeito", diz.

No Rio Grande do Norte, o primeiro bloqueador de celular foi instalado na semana passada, no presídio estadual de Parnamirim. A iniciativa gerou uma onda de incêndios a ônibus, depredações e disparos contra prédios públicos, como bases policiais.

BALANÇO DE ATAQUES

Foram registrados, até a noite da sexta-feira (5), 109 ocorrências em 33 cidades. O último caso aconteceu na quinta (4), quando dois quiosques de Lagoa Salgada (a 52 km de Natal) foram queimados.

Segundo ogoverno do Estado, os ataques estão ligados à atuação da facção criminosa Sindicato do Crime, ligado ao Comando Vermelho, do Rio, e rival do PCC.

Cerca de 1.350 homens das Forças Armadas foram enviados às ruas do Estado para ajudar no patrulhamento.

O governo decidiu transferir 23 presos suspeitos de ligação com os ataques para presídios federais em Porto Velho (RO), Campo Grande (MS) e Catanduvas (PR). 

FONTE

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Descartar os descartáveis: EXEMPLO DE SUSTENTABILIDADE?

Há quem comemore o fato de eliminar o uso de descartáveis em casa e no trabalho.

Nas empresas, há quem incentive a "boa prática".

Numa dessas publicações, efusivamente se festeja a iniciativa, como quem descobriu a pólvora.

Fazendo as contas, qualquer um vai perceber que não há economia financeira, e os danos ambientais são apenas transferidos - pois o prejuízo vem em outros produtos utilizados nos substitutos.

O custo com descartáveis onde trabalho é de cerca de R$ 75,00 mensais.
Ou seja, R$ 3,40 por dia. Considerando que somos 50 pessoas, R$ 0,07 (Sete Centavos) por dia com descartáveis por pessoa.
Ao todo, utilizamos cerca de 2.500 descartáveis mês (115 copos dia - cerca de 2 copos por pessoa/dia).

Um dos argumentos contra os descartáveis, é que é cancerígeno.

Ora, mas também o são os conservantes, aromatizantes, o açúcar, adoçantes, refrigerantes... e até o próprio cafezinho.
Ou seja, o copo é apenas mais um componente nos venenos líquidos que ingerimos.

Quanto a problemas para o "meio" ambiente, o sabão utilizado na lavagem dos reutilizáveis traz efeito semelhante.
Sem falar que não há mais economia de água nessa lavagem e relavagens (abordamos a questão higiene mais à frente).

Matérias sobre descarte dos descartáveis é um mote para mudança de mentalidade, mas carecem de fundamentação e tendem a exagerar dados. Senão, vejamos:

A economia financeira não existe; é apenas transferida e ampliada em outros insumos (produtos duráveis e insumos para sua higienização).

Não há base científica para a maioria das afirmações, como a de que os copos reutilizáveis têm um impacto bem menor para o "meio" ambiente, pois os "retomáveis" seriam 25% menos impactantes.

Numa dessas matérias, li estupefato sobre a quantidade de água gasta em cada copo descartável: 3 litros pra fazer um copo descartável.

Sejamos racionais: o planeta não tem tanta água.

E desde quando as empresas iam conseguir bancar esse custo sem transferir para o produto final?

Imagine: um copo custa R$ 0,07 para o consumidor final, e 3 litros d'água custam mais que isso.

Ou seja, exagerar os comentários servem para diminuir exageradamente a credibilidade da informação.

A matéria que li abordava um chefe que contava a experiência que tiveram na sua empresa, e apresentava uma conta de gasto de 5 mil copos descartáveis/mês, e que ao longo de 3 anos e meio evitaram o uso de "incríveis" 215 mil copos".

Ora, ainda que a informação fosse tomada ipsis litteri, tal consumo ao longo do tempo considerado (e utilizando o preço do copo de 180ml) teria um custo total de R$ 5,805,00.

Ou seja, "incríveis" R$ 135,00 por mês. Esta seria a economia máxima.

E os clientes? Certamente teriam de levar seus copos de casa...

Ao optar pelos reutilizáveis, aquela empresa além de comprá-los (e têm um custo significativo, inclusive para reposição), também passou a demandar um copeiro (o que anula todo o gasto em descartáveis e o supera em alguns milhares de reais no ano). Ademais, considerando que lave os copos entre servir um e outro cliente, amplia consideravelmente o gasto de água e de sabão na empresa (a menos que tenha também a política de não servir água e café a seus clientes - o que parece um contra-senso).

Estamos diante do que se denomina Economia de palito.

Sugestão de Leitura em anexo, e no link abaixo (contém comparativo dos custos e gastos - inclusive de água):

http://www.neoplastic.com.br/pt/noticias/noticias-do-site/copo-descartavel-consome-menos-agua-e-energia-que-o-reutilizavel-em-sua-vida-util-aponta-acv-brasil


Quanto à questão da higiene, me permita registrar a experiência que tive quando adotava o reutilizável numa empresa.

Todos os dias nossos copos eram devidamente lavados para uma nova jornada.
Ao me abastecer num desses dias, despertei para o fato de que, lavados na mesma copa, facilmente transitariam bactérias de um colega a outro, tendo a bucha como vetor.

Para minha desagradável surpresa, naquele dia tomei o primeiro gole e conferi o nome no copo; não era o meu.

Perguntei ao colega em questão:
- J______, por acaso você tem herpes?

E ele me respondeu:
- Como você ficou sabendo?


Me lasquei. Fecha o pano.


O custo com tratamento não é barato, e o risco constante de transmissão de VÁRIAS doenças, com o copo reutilizável é ampliado exponencialmente.

Os descartáveis em geral estão entre as grandes invenções da humanidade, e trazem mais benefícios que malefícios.
Ou alguém vai ampliar a campanha e propor a eliminação dos absorventes, fraldas descartáveis e afins?


Quem propõe esse tipo de solução, certamente não estudou engenharia reversa, nem reciclagem (que é um setor que cresce nas últimas décadas, gerando emprego e renda).


O que precisa haver é uma campanha de conscientização do uso e reuso - dos ítens e, principalmente, da água.


Joserrí de Oliveira Lucena
Dinheiro público é da minha e da sua conta

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Comprar ao Pequeno não é Fácil

Comprar ao PEQUENO não é fácil.

Tenho por princípio e conduta pessoal de comprar no comércio local, e nesse recorte, preferir comprar do pequeno empreendedor. É uma forma de influir na manutenção e geração de emprego e renda no meu entorno.

Esse comportamento tomado como prática em escala consciente, seria um excelente mecanismo para fortalecer e incentivar o empreendedor local e evitaria a evasão de divisas (concorrência cada vez mais globalizada).

Sou cliente do pequeno e do Pequeno.

Pequeno é dono de uma banca de jornal. Para manter uma fatia do mercado ele modernizou a banca e também faz vendas a crédito (pagamento em Cartão de Crédito).

Com os shoppings centers e centros comerciais espalhados por todas as grandes cidades, não tem sido fácil para o pequeno atrair clientes e manter o nível de receitas de seu pequeno negócio.

Também não tem sido fácil para os clientes de Pequeno irem até sua banca, pois além de terem quase todo o conteúdo das impressões disponíveis em mídia interativa, a banca de Pequeno não oferece a comodidade do ambiente climatizado, estacionamento privativo e todo o complexo de produtos e serviços do Grande empresário.

Segundo Pequeno, o lucro da venda de revistas é razoável para os padrões atuais do mercado: 20%.

Tudo uma maravilha, mas surge um pequeno problema: os clientes de pequenos e grandes quase não usam mais cédulas; usam cartões magnéticos - é uma onda irreversível.

E Pequeno tem uma regra: não vende revistas em cartões (débito ou crédito).

Segundo ele, as despesas das operadoras chega perto de 15% do faturamento (acho que superdimensionado, pois as taxas de cartão devem estar por volta dos 7%, incluindo os custos operacionais).

Como Pequeno só vende revistas "no dinheiro", acaba descartando os clientes que usam cartão - que são encaminhados a comprar no shopping, agora.

Mesmo considerando que os custos totais do cartão de crédito chegassem a 15%, quanto tempo leva até Pequeno perceber que é melhor ganhar 5% do que nada?

Comprar do Pequeno não é fácil.


Joserrí de Oliveira Lucena
Dinheiro público é da minha e da sua conta

domingo, 5 de junho de 2016

Estado de Coisas Inconstitucional (ADPF 347 - STF)

ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL
ADPF 347 - STF

Joserrí de Oliveira Lucena


Nenhuma mãe merece tanto amor e tanto carinho quanto a mãe de um encarcerado!
A frase acima, rabiscada numa parede de presídio, é um pequeno fragmento que demonstra a percepção que o apenado tem da condição em que vive. A frase pode ser o indicativo que uma mãe de encarcerado seria a pessoa mais indicada para explicar o que se convencionou chamar de Estado de Coisas Inconstitucional.
Esse termo não soaria tão estranho se não fosse cunhado pela mais alta Corte do país, guardiã do ordenamento “Constitucional”. Logo, falar de Estado de Coisas Inconstitucional na Corte Constitucional é surreal.
Mas, em tempos em que o Poder Executivo (em todas as esferas) tem se mostrado inerte e incompetente, além de imerso em brigas de gangues pelo comando (como um fim em si mesmo), pouco se importando com os destinos de cidades, estados ou mesmo da Nação, o ativismo judicial se mostra uma alternativa, e, no caso exposto aqui, foi provocado por um partido político (Poder Legislativo) – ou seja, o judiciário vai sendo convocado a um protagonismo que não seria necessário se cada Poder da república cumprisse seu papel.
Foi esta a primeira vez que o Supremo Tribunal Federal brasileiro declarou que vivemos esse Estado de Coisas Inconstitucional, e isso ocorreu na manifestação em uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental patrocinada pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), com pedido de medida cautelar, na qual discute o 'estado de coisas inconstitucional' e formula 8 (oito pedidos) para corrigir práticas de flagrante violação de direitos fundamentais no âmbito do sistema penitenciário brasileiro, dentre as quais pede que o Tribunal:
a) determine que os todos juízes e tribunais, "em caso de decretação ou manutenção de prisão provisória, motivem as razões que impossibilitam a aplicação das medidas cautelares alternativas à privação de liberdade" (artigo 319 do CPP);
b) reconheça a aplicabilidade imediata do Pacto de Direitos Civis e Políticos e da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, determinando "que todos os juízes e tribunais passem a realizar audiências de custódia, no prazo máximo de 90 dias";
c) determine aos juízes e tribunais que passem a considerar, "fundamentadamente, o dramático quadro penitenciário brasileiro no momento de concessão de cautelares penais, na aplicação da pena e durante o processo de execução penal".
O que também está em discussão pelos ministros, é saber se estão presentes os pressupostos e requisitos necessários à concessão da cautelar.
Essa ADPF recebeu o número 347, e em decisão de 27/08/2015, o STF reconheceu a inconstitucionalidade do caótico sistema penitenciário brasileiro. O julgamento foi suspenso após voto de Marco Aurélio, que assim determinou;
1) que os juízes fundamentem a não aplicação das medidas cautelares alternativas do art. 319 do CPP;
2) que sejam realizadas audiência de custódia, em no máximo 24h após a prisão (PIDCP, art. 9.3 e CADH, art. 7.5) – fazendo aplicação do direito internacional;
3) que os juízes considerem o quadro dramático do sistema penitenciário quando determinarem alguma prisão;
4) que se apliquem as penas alternativas (CP, art. 44);
5) que a União libere o saldo acumulado do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional) abstendo-se de novos contingenciamentos.
De ofício, também foi deferida medida de natureza cautelar sugerida pelo Ministro Roberto Barroso para a realização de diagnóstico da situação denunciada, de modo a permitir um uma melhor instrução do processo para o julgamento de mérito – em data incerta e não sabida, como outras decisões importantes, são postergadas pelos ministros da Corte.
Deveria ser óbvio que os presos merecem tratamento respeitoso. Afinal, é Constitucional.
A Constituição Federal proclama no artigo 5º, inciso XLVII: “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis”. E no inciso XLVIII: “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
Ademais, o Código Penal diz, no art. 38: O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”.
E a LEP (Lei de Execução Penal) dispõe no artigo 40: Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios”.
Ora, reconhecer o Estado de Coisas Inconstitucional é constatação de um cenário fático com quadro de agressões em larga escala aos direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro, cuja correção de rumos deveria surgir do próprio Judiciário; mas a inépcia torna cada vez mais distante uma possível solução, que precisa embora seja estrutural, começa por corrigir condutas, comportamentos e até mesmo novas alternativas do enfrentamento aos problemas existentes, e que propiciassem criar um ambiente para resultados satisfatórios.
Difícil acreditar que o Supremo Tribunal Federal, negligente como tem sido de suas responsabilidades, ao cuidar do mérito da ADPF 347, não adote mais uma solução importada, e que saiba atuar como guardião dos direitos constitucionais, zelando por perseguir a dignidade da pessoa humana e a garantia de preceitos fundamentais.
É difícil, mas ainda assim não nos custa debater e militar no sentido de dar visibilidade à hipocrisia do Estado em deslegitimar o ordenamento jurídico e violar direitos fundamentais.
Imaginando que possam importar as medidas de outros países, citamos a título de comparação o que fez a Corte Constitucional da Colômbia: foram os colombianos que conceberam, pioneiramente, o termo ECI para Estado de Coisas Inconstitucional, e aprovaram medidas inéditas para combatê-lo. A primeira decisão foi proferida em 1997, e reconhecia omissão generalizada das autoridades públicas em relação à implementação de providências capazes de satisfazer determinado direito dos professores. Em 1998, noutra sentença, a Corte colombiana, tratando da complexa situação dos presídios do país, decidiu por declarar o Estado de Coisas Inconstitucional do sistema carcerário, atestando condições de vida infames, de situação atentatória à dignidade da pessoa humana, em estabelecimentos marcados pela superlotação.
E em 2004, a Corte da Colômbia julgando caso de pessoas vítimas de migração forçada em razão da violência dos conflitos armados que marcam o país (“deslocadas”), reconheceu o ECI diante da omissão estatal no atendimento a essas pessoas, tendo determinado uma série de providências para a superação das falhas estruturais no auxílio dessas pessoas em situação de vulnerabilidade.
Se resolver copiar um modelo inspirado nas structural injunctions (Estados Unidos), o STF pode adotar a aplicação de decisões estruturantes, singulares, incrementais, diferente do “feijão com arroz” do uso de violência, de medidas disciplinares excepcionais, mas com a realização de um amplo debate nacional que estude as causas, para agir nelas, e não apenas a busca de paliativos, que tentam (infrutiferamente) intervir no resultado. Doutra forma, será reforçar uma cultura de mais violações dos direitos garantidos pela lei fundamental.
Creio, entretanto, que é imprescindível mobilizar os diversos atores sociais (igreja, escola, ongs, oscips, clubes de serviço, mídia, partidos políticos, poderes da república, entidades de classe, a população em geral) para a discussão temática do problema, e não apenas esperar uma solução mágica do “todo poderoso” STF – cada vez mais adepto do ativismo judiciário, alimentado pelo culto à personalidade e às “soluções” paliativas (e por isso mesmo, ineficazes).
Os direitos e garantias Constitucionais precisam ser respeitados – posto que já positivados – e a adoção de novos ordenamentos internacionais, que visem construir minimamente a ideia de dignidade da pessoa humana, não apenas aos cidadãos livres, mas, e sobretudo também aos apenados.
Devemos aproveitar essa “deixa” para ampliar o debate das condições nada humanas a que é submetida a população carcerária, da qual muito se divulgam as rebeliões, fugas e outras condutas, mas que nada se fala da falta de condições mínimas de higiene, saúde, e tratamento digno.
Ingo Wolgang Sarlet, conceitua dignidade da pessoa humana como sendo uma…
“qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.
Não fazer nada para cessar esse Estado de Coisas Inconstitucional, também é tortura, e isso é mais gravoso que a pena.
Que não apenas as mães dos encarcerados, mas que cada um de nós seja sensível à situação dos apenados, e que nos empenhemos em buscar formas de propiciar condições de cumprimento de penas com a garantia dos direitos e preceitos fundamentais e em ambiente com condições onde a dignidade da pessoa humana seja uma realidade e não o atual cenário caótico, que acaba sendo uma “fábrica de loucos”, como declarou em entrevista à TV Record um dos mais famosos presos do Brasil, Fernando Beira-Mar (e o traficante nem de longe cumpre sua pena nas mesmas condições da maioria dos apenados).

Que o STF tenha um lampejo de civilidade, e se manifeste na ADPF 347 de forma a movimentar a Corte, o Judiciário e a Nação na direção de medidas que interrompam o ciclo e cessem esse Estado de Coisas Inconstitucional.

Joserrí de Oliveira Lucena
acadêmico de Direito - UERN
------
Artigo escrito ao estudar a cadeira Processo Penal III, sob a ministração da Profª. Drª. Carla Maria Fernandes Brito Barros, do curso de Direito, na UERN – Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – em junho/2016.

Obrigado por visitar este Blog

Este é um espaço para a livre e democrática manifestação de pensamento... não sinta-se constrangido a concordar com o que está escrito, mesmo com os conteúdos com que se identificar.

Se fizer citação, favor indicar a fonte.

Veja no rodapé como fazer download de livro sobre alimentação saudável para diabéticos DM1

Diabetes: uma batalha a cada dia

Se você conhece alguém com diagnóstico de diabetes tipo 1, repasse este link para download desse livro, que é um verdadeiro manual da alimentação.

http://www.sanofi-aventis.com.br

No quadro Search escrevam "Comida que cuida 2".
Se quiserem, podem fazer o download do livro em pdf.