Mais um dos artigos escritos com o incentivo do professor Carlos Sérgio, da UERN, na Cadeira de Direitos Humanos.
Obrigado, professor, por incentivar seus alunos a encararem os problemas do Direito não apenas sob a ótica do positivismo, mas também sob o prisma do caleidoscópio Social.
Obrigado, professor, por incentivar seus alunos a encararem os problemas do Direito não apenas sob a ótica do positivismo, mas também sob o prisma do caleidoscópio Social.
Direitos Humanos e Criminalidade no Contexto Urbano
Bandido bom, é
bandido morto! Esse é o lema de uma sociedade na qual sentimentos de
insegurança e impunidade parecem caminhar de braços dados e a passos largos.
A violência
urbana ganha contornos gritantes de surrealismo, posto que convive no seu dia a
dia com um crescente cenário onde chacinas, execuções, tráfico de drogas,
prostituição, pirataria, assaltos à mão armada e outros delitos de “menor
porte” ofensivo são tão lugar-comum como ir à padaria comprar pão e leite.
A sociedade,
cauterizada pela alta exposição a esse cenário, por vezes nem fica mais chocada
– pelo contrário, alimenta a indústria que vende a violência, como os
telejornais sem pauta e seus helicópteros super-equipados para transmição ao
vivo (e que quanto mais em tempo real, melhor).
Ao consumir
esse tipo de “informação”, a sociedade também se alimenta da violência gratuita,
que faz vítimas anônimas todos os dias, e transforma apresentadores de
televisão em autoridades, especialistas e justiceiros verbais de sua aparente
indignação.
Em busca dessa
“cobertura”, pseudo-jornalistas dão sua própria versão dos fatos, expõem
vítimas e arrastam o telespectador para um júri popular virtual, no qual o
ápice é condenar imediatamente os suspeitos, transformando-os em culpados
instantaneamente. Não raro os personagens desses episódios cotidianos têm sua
dignidade devastada, suas privacidades escancaradas e seus rostos expostos em
rede nacional, não raro de dentro das cadeias – sem a chance de um julgamento justo, isento, imparcial e com
ampla defesa – o julgamento e a sentença ocorrem ali, de maneira "super prática".
Talvez por isso o lema acima ("bandido bom é bandido morto") se torne cada vez mais um anseio e a legitimação
da violência pela violência.
Espera-se mais
do Estado, no trato desse tema. Percebe-se que há um grande esforço em dar publicidade ao exaustivo
trabalho para montar um detalhado “mapa” da criminalidade, a apresentar o
levantamento estatístico das causas da violência urbana, a monetarização da
ação do crime (ex.: as manchetes destacam bilhões de reais em apreensões) ou ainda os altos custos no seu
combate. Em entrevistas coletivas, secretários de segurança e delegados usam a mídia como propaganda pessoal, e como palanque eleitoral para garantir votos.
Mas isso é
intangível para a população, que espera resultados concretos, como a redução
dos casos de violência urbana. Isso necessariamente não se traduz em maior abrangência dos
Direitos Humanos aos cidadão (paradoxalmente a percepção social é de que os
“direitos humanos” são os direitos do bandido).
Portanto, a
frase popular “bandido bom é bandido morto”, segundo o jornalista e doutor em Ciência
Política Leonardo Sakamoto, é resultado de uma sociedade doente, na qual as
execuções (de pobres e pretos) – não raro da mesma classe social dos que
proclamam essa sentença – caracterizam uma verdadeira batalha interna. Destaque-se que tais atos normalmente são registrados nos Boletins de Ocorrência como resistência da vítima
(mesmo que algumas vítimas tenham morrido com tiros na nuca).
Os jornais
aumentam essa atmosfera de “guerra” urbana, na qual não faltam defensores de
exceções ou supressões aos direitos civis, e em que nos acostumamos a achar normal as
cenas de batalhões ocupando os morros e favelas, sob a justificativa de
“pacificação”, por uma breve e discutível sensação de segurança.
Esse cenário
escancara a ineficiência do Estado em fornecer as condições, desde as premissas
como Educação, Saúde, Moradia... o que redunda em uma sociedade abandonada da
proteção dos braços do Estado, e entregue às suas próprias regras e leis, e na
qual cada um busca uma forma de sobrevivência, na qual a criminalidade surge
como uma opção impalatável, mas deglutível.
Esse modelo
está distante do que defende nosso ordenamento jurídico e de um sonho de ideal de vida
no qual se busque mudanças sociais estruturais, com a busca do fornecimento de
qualidade de vida desde a primeira infância, até a velhice, como premissa de
dignidade humana.
Urge ampliar
as discussões acerca do tema, com representantes do aparato do Estado, via seus
três poderes, de operadores do sistema de Segurança Pública, dos agentes da
Saúde Pública, e principalmente dos Educadores (cientes de que mudança cultural só ocorre
entre os ciclos das gerações, o que leva anos).
Desse modo,
podemos corrigir os rumos de uma sociedade que está se tornando a cada dia mais
próxima de defender a pena de Talião (Olho por Olho, Dente por Dente), num retrocesso que desconhece e desmerece
a luta pela construção dos Direitos Humanos ao longo da História.
Doutra sorte,
poderíamos perguntar: do que mais estamos dispostos a abrir mão, ao defender um
modelo no qual as falhas do sistema sejam corrigidas com o uso da força por conta própria?
Joserrí de Oliveira Lucena
Acadêmico do Direito - UERN
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